(escrito para o desafio “uma imagem, um texto”, do @cavaleiros_do_scifi)
A noite. A chuva. As luzes. Os anúncios. Os letreiros. O chão molhado, escorregadio, sujo. A fome. Ah, a fome! O cheiro de álcool barato, o cheiro de restos de comida, o cheiro do vômito, de urina, de fezes. Aquele inconfundível tintilar, o chacoalhar de moedas numa velha caneca de ágata. Sofridas silhuetas esfomeadas, entediantes silhuetas de apáticos trabalhadores a caminho de suas casas, com suas roupas de escritório, seus pequenos pseudoluxos, suas rodas de hamsters, suas corridas em busca do nada.
No meio disso tudo, tem E.L.A., com seu salto agulha, seu microvestido em tecido sintético, sua estilosa cartola, seu guarda-chuva que mais serve de adereço que proteção, e seu smartphone de última geração. E.L.A. desfila, exuberante, luxuriante, artificial, em meio ao caos da metrópole. Sempre foi assim, e assim sempre será.
Entra século, sai século, e a promessa acaba sempre devorando aqueles que n’E.L.A. creem. Sintética. Elétrica. Superior.
A tecnologia nunca foi meio. A tecnologia sempre foi riqueza. A tecnologia sempre foi fim. O meio é o pobre.